A reforma da Previdência que o governo Michel Temer encaminhou ao Congresso estabelece que todos os trabalhadores do país – exceto os militares – só poderão se aposentar aos 65 anos e desde que tenham contribuído com o regime por pelo menos 25 anos. Entretanto, apesar desse tempo mínimo de contribuição, ao cumprir esse requisito, o aposentado terá direito a apenas 76% do benefício. A cada ano de contribuição a mais, ele vai conquistando o direito a mais 1%. Significa que o trabalhador vai precisar contribuir por 49 anos para garantir o recebimento de 100% do benefício.
Atualmente, o cálculo é feito de duas formas: em cima da contribuição, 35 anos para homens e 30 mulheres; ou por idade, 65 homens e 60 mulheres, com 15 anos de contribuição mínima. As novas regras prejudicam, sobretudo, os mais pobres. Caso sejam aprovadas, trabalhadores informais, do campo e mulheres serão os mais penalizados. No caso do magistério, o impacto é imenso, já que a proposta do governo acaba de vez com o direito de as professoras – que, via de regra começam a dar aulas muito cedo – se aposentarem com 25 anos de contribuição e os professores, após 30 anos.
A única categoria que não será afetada pelas novas normas previdenciárias é a dos militares. Oficialmente, o governo alegou que não incluiu os militares na reforma pois o regime de aposentadoria do Exército, da Marinha e da Aeronáutica não precisaria ser modificado por meio de emenda à Constituição, como ocorre com servidores civis e trabalhadores da iniciativa privada. A gestão não informou, entretanto, se haverá um projeto de lei com novas regras de aposentadoria dos militares.
A situação pode piorar ainda mais: embora a idade mínima seja de 65 anos na proposta, o projeto diz que a regra pode ser alterada automaticamente, a depender a expectativa de vida do brasileiro. De acordo com as estimativas atuais usadas pelo ministro, a idade mínima deverá subir ao menos duas vezes até 2060, chegando a 67 anos.
Direito adquirido, conceito flexível
Segundo o secretário de Previdência do Ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, as novas regras, se aprovadas pelo Congresso Nacional, teriam validade somente para as pensões concedidas a partir daquele momento, ou seja, não abrangem as pensões já pagas. Segundo ele, isso significa que o governo não está mexendo em “direito adquirido”.
Ocorre que, nessa interpretação, a gestão exclui as pessoas que já estão no mercado de trabalho e que começaram a contribuir para o regime acreditando que poderiam se aposentar com as regras em vigor naquele momento. Para estas, restou uma regra de transição.
Para os trabalhadores que estão mais próximos da aposentadoria (acima de 50 anos no caso dos homens e 45 anos, mulheres), será permitido requerer a aposentadoria pelas regras atuais, pagando um pedágio: um adicional de 50% sobre o tempo que faltava.
Assim, um homem com 52 anos e 34 anos de contribuição precisaria, pela regra antiga, trabalhar mais 1 ano para requerer o benefício. Sob as regras novas, ele deverá trabalhar 1 ano e meio.
Abaixo do mínimo
A PEC do governo mantém o valor das aposentadorias atrelado à política de reajuste do salário mínimo. Mas os beneficiários da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) — deficientes e idosos da baixa renda — poderão receber um valor inferior ao mínimo. A idade para requerer o benefício assistencial também subirá dos atuais 65 anos para 70 anos.
O valor das pensões por morte também será menor que o piso nacional. “Nas pensões por morte, o valor pago à viúva ou ao viúvo será de 50% da aposentadoria do morto com um adicional de 10% para cada dependente. O valor pago será então igual a 60% no caso de um dependente e de 100% no caso de cinco dependentes. Essa cota não se reverterá para o parente ainda vivo quando o filho completar 18 anos de idade. Também não será possível acumulá-la com outra aposentadoria ou pensão”, informou o secretário.
Trabalhadores rurais
Os trabalhadores rurais e pescadores artesanais também terão que seguir as novas regras da Previdência, caso a PEC seja aprovada. Categorias que costumam ingressar no mundo do trabalho muito cedo e cujo ofício é muitas vezes extenuante, só poderão se aposentar com 65 anos de idade e 25 anos de contribuição
Mais que isso. Atualmente, os trabalhadores do campo podem se aposentar sem necessariamente terem contribuído para o regime, precisam apenas comprovar a atividade no campo. A partir da aprovação da reforma, eles serão obrigados a pagar contribuição, que será diferente do valor pago pelo trabalhador urbano.
A nova alíquota para a aposentadoria rural só será decidida depois de a PEC ser aprovada, por meio de um projeto de lei a ser enviado ao Congresso Nacional.
Receitas sobre exportações
O governo também quer acabar com a isenção da contribuição previdenciária sobre exportações. De acordo com Marcelo Caetano, os exportadores que contribuem hoje sobre as receitas terão que pagar a contribuição previdenciária também sobre as receitas obtidas com as vendas ao exterior.
Reação do movimento sindical
Barrar esse ataque exigirá uma grande mobilização do movimento sindical e as centrais já se manifestaram contra o projeto. “A CUT jamais irá aceitar que desiguais sejam tratados de forma igual, como pretende o governo do ilegítimo e golpista Michel Temer”, disse o presidente da CUT, Vagner Freitas.
Para Vagner, a idade mínima é injusta com a classe trabalhadora, em especial com os que começam a trabalhar mais cedo e as mulheres, que vão ter de trabalhar e contribuir mais e ganhar menos, se também for aprovada a desvinculação dos aumentos reais do salário mínimo dos reajustes dos benefícios dos aposentados e pensionistas.
“O governo justifica que precisa atrair investidores. No entanto, tenta jogar o ônus da crise no colo do trabalhador”, critica o presidente da CTB, Adílson Araújo. “Os planos para a retomada do crescimento econômico não devem envolver a questão previdenciária. Com o mundo em retração, diversos países, sabiamente, discutem reduzir taxas de juros para aquecer a produção, o mercado. O governo brasileiro faz o caminho inverso: aprova uma reforma da Previdência num momento em que os trabalhadores estão passando por um processo de profunda flexibilização dos direitos sociais e trabalhistas.”
O mito do déficit da Previdência
Um dos argumentos para a reforma é o suposto déficit da Previdência. A TV Contee mostrou recentemente, porém, que essa justificativa é, na verdade, um mito. Ao contrário da cantilena oficial, análise técnica do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) em parceria com a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP) também mostra que há um superávit histórico da Seguridade Social. E boa parte desse excedente vem sendo desviada para cobrir outras despesas, especialmente de ordem financeira. “O malfadado déficit da Previdência Social nada mais é do que um mito, criado para esconder a responsabilidade do Estado por suas incessantes políticas de renúncias fiscais, desonerações e desvinculações de receitas, além de sua ineficiência na cobrança de dívidas ativas”, afirma o documento da Anfip.
Assista à entrevista da economista Denise Gentil à TV Contee sobre o mito do déficit da Previdência:
Fonte: Contee, com informações dos portais Vermelho, CUT e CTB