O Plenário do Senado realizou dia 11 sessão temática sobre a Reforma Trabalhista (PLC 38/2017). As várias intervenções, de expositores e parlamentares, desnudaram os diferentes interesses entre classes (empregadores e empregados) na argumentação a favor e contra a proposta governamental, apoiada e aprofundada (para pior, na opinião dos que defenderam os interesses dos trabalhadores) na Câmara dos Deputados. A próxima sessão sobre o assunto foi marcada para terça-feira, 16.
O professor Hélio Zylberstajn, da Universidade de São Paulo (USP), defendeu a proposta governamental e disse que o fim da da contribuição sindical pode fortalecer o movimento sindical, incentivando fusões entre sindicatos. Para ele, que preside o Instituto Brasileiro de Relações de Emprego e Trabalho (IBRET), os movimentos sindicais foram enfraquecidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O chamado “negociado sobre o legislado” criará oportunidades para ganhos mútuos. A reforma vai ampliar e garantir a negociação, reduzir custos de transação, reduzir incertezas, modificar atitudes e criar emprego.
O professor de direito do trabalho e advogado Antônio Galvão Peres alegou que a reforma pode evitar que as relações de trabalho gerem judicialização excessiva e criticou a “ausência de racionalidade” da CLT. A reforma não retira direitos trabalhistas e dá mais poder de negociação para empregadores e trabalhadores. Criticou a unicidade sindical e o imposto sindical.
O deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), presidente da Força Sindical, denunciou que a reforma aponta a “onda” contra o movimento sindical, ao permitir a criação de comissões no interior das empresas e em cuja composição os patrões poderão opinar, com o intuito de fazer a livre negociação dos salários. “Os sindicatos, que todos falam que não servem para nada, é que aumentam os salários todos os anos. Garantimos o mercado interno para fazer a economia girar”, asseverou. Condenou itens da reforma, como acontratação por Pessoa Jurídica, que vai diminuir a formalização e a arrecadação do governo; a jornada intermitente, que impõe pagamento de multa se o trabalhador não conseguir comparecer ao trabalho quando convocado; o pagamento de indenizações em espécie, dentro das empresas; a possibilidade de acordo, com saque de uma parte dos recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que vai minar o dinheiro do fundo.
O diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, argumentou que a reforma vai fragilizar ainda mais a situação do trabalhador. “Precisamos modernizar o nosso sistema de relação de trabalho. 40% da força de trabalho não tem proteção sindical, vive na informalidade e provavelmente não terá proteção previdenciária”, opinou. O projeto é uma tentativa de redução do custo estrutural do trabalho como forma de superação da crise econômica, o que pode ter o efeito contrário. A reforma proposta não permite que as relações de trabalho sustentem o crescimento econômico assentado na agregação de valor, no incremento da produtividade, no fortalecimento do mercado interno com geração de emprego e de salário. “Esse projeto não está preocupado com nada disso”, avaliou.
A opinião dos parlamentares
A senadora Marta Suplicy (PMDB-SP) defendeu que o Senado aperfeiçoe o projeto: “Aqui há um consenso de que deve haver mudanças, mas também o trabalhador não pode ser um perdedor nessa história”. Ela citou a possibilidade de se eliminar os 15 minutos de descanso garantido às mulheres entre a jornada regular e o início das horas extras. “Que eu saiba, homem não menstrua. Esses 15 minutos dados a uma mulher pode ser muito importante, sim, para ela”, afirmou.
O senador Paulo Rocha (PT- PA) considerou que o projeto retroage décadas ao eliminar avanços importantes das classes trabalhadoras na relação com o capital. “Colocamos na Constituição avanços fundamentais que trazem equilíbrio e empoderam patrões e empregados para buscar, na negociação coletiva, esse equilíbrio. Respeitando o capital, mas valorizando a mão de obra”, observou. Criticou o texto por permitir ao patrão no setor rural contabilizar a moradia e o alimento ofertado a trabalhadores rurais como salário.
Já o senador Hélio José (PMDB-DF) afirmou ser favorável à proposta original enviada pelo governo, e não ao texto que foi aprovado pela Câmara dos Deputados. “Eu não consegui até hoje entender o projeto ser tão desconfigurado como chegou aqui ao Senado Federal”, afirmou. Criticou a terceirização irrestrita, a retirada da homologação do sindicato no momento da demissão, o trabalho em ambientes insalubres e a relação direta entre trabalhador e patrão sem a intermediação do sindicato. ”Eu sou apoiador do governo, mas não estou aqui para carimbar tudo aquilo que vem a fórceps, que não vai nos atender”, ponderou.
Para o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), inviabilizar o acesso da pessoa mais desprotegida à Justiça do Trabalho “é muito perverso”. Com a reforma, esse benefício poderá ser concedido pelos juízes apenas para aqueles que ganham até 40% do limite máximo de aposentadoria do INSS (R$ 5.531,31) e àqueles que comprovarem insuficiência de recursos.
O senador Paulo Paim (PT-RS) disse que o projeto “é ruim, perverso e desumaniza a relação entre empregado e empregador ao retirar direitos, enfraquecer sindicatos e priorizar o negociado sobre o legislado”. O texto enfraquece a Justiça do Trabalho, diminui a proteção ao trabalhador, reduz direitos, enfraquece sindicatos, permite negociação de verbas rescisórias, dá poder para o empregador se impor em negociações individuais ou coletivas e torna raras as horas-extras, dentre outros defeitos.
No mesmo caminho foi o senador Lindbergh Farias (PT-RJ): “Espero que este Senado tenha juízo, porque essa proposta do Governo Temer é indecorosa”, disse. Ele teme que, se aprovado, o projeto leve o país a uma convulsão social.
O senador Roberto Requião (PMDB-PR) ironizou que, ao texto, só falta sugerir que o trabalhador almoce e jante durante as férias, para não interromper a jornada de trabalho. Questionou se os participantes da sessão que defenderam o projeto entendem mesmo do assunto ou se são assessores da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp. “Já falei sobre essa barbaridade e eu recomendo ao Plenário o exorcismo, não apenas a rejeição. Foi urdida por Satanás essa proposta”, vituperou.
Também para a senadora Regina Sousa (PT-PI) a reforma “saiu da cabeça dos patrões”. Citou a possibilidade de redução de intervalos para refeições a 15 minutos. “É o sanduíche numa mão e a operação da máquina na outra”, reclamou. Considerou retrocesso a permissão de grávidas e lactantes em ambientes insalubres e duvidou da possibilidade de a trabalhadora ter o poder de recusar esse trabalho, diante de sua fragilidade na negociação individual. Sobre a permissão de incluir não sindicalizados nas representações de trabalhadores nas empresas, queixou-se: “Será o retorno às comissões de fábrica do funcionário padrão, puxa-saco ou dedo-duro”.
A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) alertou: “Não vamos aceitar regime de urgência dessa matéria. Vamos discutir à exaustão”. Sugeriu a presença de economistas na próxima audiência sobre o assunto. Criticando os expositores favoráveis ao projeto, lamentou ver ”quem tem direito garantido vir aqui e achar que a precarização do direito alheio é algo justo. Vocês vêm fazer lobby aqui dentro”.
Do outro lado, o senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) afirmou que a reforma é necessária e que não aceita o discurso de que é “coisa do demônio”. “A retomada do emprego no Brasil passa obrigatoriamente por essa reforma trabalhista. Esse trabalho intermitente, por exemplo, nós vamos trazer muita gente da informalidade”, explanou.
O senador Jorge Viana (PT-AC), por sua vez, discorreu que as leis trabalhistas em vigor no país completam 74 anos e precisam de atualização. No entanto, o projeto do Executivo, que tinha sete artigos, foi transformado em um texto que altera mais de mil dispositivos da legislação, na Câmara, e não pode ser discutido em uma semana e depois ser aprovado “com rolo compressor”. Sugeriu pelo menos três meses de análise: “Lamento afirmar que, com essa proposta do governo, apoiada pela Câmara, estamos levando” (as relações de trabalho) “para o começo do século 20, e não andando para a frente, mas andando para trás”.
Fonte: Contee – Carlos Pompe, repórter